Análise

Europeias: o que é ganhar e perder (para não se deixar enganar)

As sondagens já saíram todas e os líderes começaram a fixar objetivos para a noite de domingo. Olhando para os factos - e não para os discursos -, eis o que pode ser vitória e derrota para cada um

Texto David Dinis

PS: o que é mais do que “poucochinho”?

<span class="creditofoto">Foto Tiago Miranda</span>

Foto Tiago Miranda

António Costa fez destas europeias um referendo ao Governo (e, portanto, ao PS). O risco é inovador - nunca um primeiro-ministro o tinha feito em europeias, que costumam ser penalizadoras. Mas o risco também é controlado: o PS já Ia na frente das sondagens e o resultado de há cinco anos põe a fasquia baixa. Ou melhor, põe a fasquia “poucochinha”, que foi como o próprio Costa classificou a vitória de Seguro em 2014, lançando-o numa campanha interna que acabou como sabemos.

Assim, Costa e Pedro Marques precisam de superar os 31,46% de votos de há cinco anos, mesmo que, com o aumento da abstenção, isso signifique pouco mais do que os 1.033.158 votos que conseguiu. Parece muito? Não é: em votos totais, foi o segundo pior resultado de sempre do partido na corrida para Bruxelas.

Mas uma vitória a sério implica subir bastante mais porque, para fazer destas eleições uma rampa de lançamento para as legislativas de outubro, Costa terá De chegar aos 35%. Isto para ambicionar ficar mais perto de uma maioria absoluta, ganhando margem de manobra negocial para a segunda legislatura. As sondagens da última semana, incluindo a do Expresso, mostram que isso é bem possível.

PSD: pressupostos errados, meta baixa

<span class="creditofoto">Foto Rui Duarte Silva</span>

Foto Rui Duarte Silva

Rui Rio tem dito que o PSD terá um bom resultado se subir alguns pontos face a 2014. Mas parte de pressupostos muito contestáveis, no mínimo. Primeiro: o resultado desse ano foi o pior de sempre para o PSD - só com seis eurodeputados eleitos e, junto com o CDS, chegando apenas aos 27,71%. Foram pouco mais de 900 mil portugueses a votar na PàF, num momento eleitoralmente impossível: ainda com a troika por cá, no fim do plano de austeridade. Ora, hoje o PSD não está no Governo e já mudou de líder - o que devia fazer do seu objetivo algo bem mais ambicioso.

O segundo pressuposto errado é que Rui Rio divide os votos de 2014 como se o PSD tivesse tido 20% e o CDS 7%. Errado, porque o CDS, naquela altura, estava muito penalizado nas sondagens e ainda na ressaca da crise política do “irrevogável”. Assim, ambicionar que 23% sejam já “um bom resultado” para o partido, como disse na quarta-feira Paulo Mota Pinto, presidente do Conselho Nacional, é muito abaixo do “poucochinho”. Um resultado aceitável seria, pelo menos, igualar o pior resultado do PSD quando concorreu sozinho: 1.078.528 votos, 31,11%. Foi em 1999, com Pacheco Pereira como candidato e contra Mário Soares. Ora, nas sondagens de hoje o PSD consegue o máximo de 28% - que dariam a Rio o que ele chamaria “vitória”. Mas não é: Pedro Marques está muito longe de ser Soares…

CDU: derrota quase certa?

<span class="creditofoto">Foto Ana Baião</span>

Foto Ana Baião

O azar de Jerónimo de Sousa nesta campanha vem da excelente notícia que teve há cinco anos: o PCP conseguiu eleger três eurodeputados, com 12,68% dos votos - 416.446 no total. Foi o melhor resultado em europeias desde… 1989. E repetir o feito é, realmente, muito difícil. Sobretudo se o PS subir. Daí que baixar não seja surpresa, nem possa ser apresentado como uma derrota por si mesma. Mas há um cenário que é de pesadelo para os comunistas: se o PCP fica muito abaixo dos 10%, ou abaixo dos 309.401 votos de 2004 (o seu pior score nas urnas), e se o Bloco subir muito ao mesmo tempo, isso coloca o PCP perante uma crise eleitoral, visto que as autárquicas já correram muito mal. Ao que dizem as sondagens, é possível que isso venha a acontecer. No domingo se verá.

Bloco: up is the way?

<span class="creditofoto">Foto Paulo Novais / Lusa</span>

Foto Paulo Novais / Lusa

Marisa Matias ganhou balanço com a campanha, capitalizando os mais de 10% que teve nas presidenciais. E o Bloco precisa desse capital para ganhar embalagem para as legislativas. É que, em 2014, o Bloco teve apenas 4,56%, com 149.628 votos nas urnas. Foi muito mau, mas isso dá amplo espaço para recuperar agora. Mas atenção: só numa das europeias passadas o Bloco conseguiu uma vitória: foi em 2009, quando Sócrates perdeu forte e feio para o PSD e Paulo Rangel. Hoje, à partida, será mais difícil, porque o PS está mais forte do que naquela altura.

Mesmo assim, segundo as sondagens, o Bloco pode agora conseguir entre dois a três eurodeputados. E até, de acordo com um dos inquéritos, suplantar a fasquia dos 10%. Seria o cenário de sonho: ganhar votos - não ao PS, mas ao PCP. E ficar com a grande vitória que os comunistas reclamaram há cinco anos. O mínimo? É pelo menos passar de um para dois eurodeputados.

CDS. Pior é quase impossível

<span class="creditofoto">Foto Nuno Botelho</span>

Foto Nuno Botelho

Falta falar do CDS e de Nuno Melo, que também tem a fasquia baixa: em 2014, os centristas correram juntos com o PSD. E ficaram, pela primeira vez, só com um eurodeputado eleito. Basta, assim, a Nuno Melo conseguir levar consigo o número dois da lista para cantar vitória. Mas podia exigir-se mais aos centristas: se o resultado do PSD for realmente baixo (para o que é o seu registo histórico), o partido de Assunção Cristas só ganhará realmente balanço para as legislativas - seguindo o ótimo resultado que a sua líder conseguiu em Lisboa - se suplantar os 10% e atingir os três eurodeputados. Historicamente, já aconteceu algumas vezes… mas é preciso recuar a 1994 para encontrar algo semelhante (época de Manuel Monteiro, com Portas como estratega). Aí, com o cavaquinho em queda, o partido conseguiu 379.044 votos, chegando aos 12,45%. Com a abstenção mais alta dos dias de hoje, nem seriam precisos tantos votos para chegar lá perto. Mas nada nas sondagens indica que esse cenário seja hoje possível. Uma vez mais: chegará o “poucochinho”?