Política

Quem é o rapaz que, aos 21 anos, fechou a avenida da Liberdade

Quem é o rapaz que, aos 21 anos, fechou a avenida da Liberdade
Tiago Miranda

Garante que começou sozinho no Facebook e, em cinco dias, organizou a manifestação "Pela Liberdade" que, este sábado, levou a interromper o transito na principal avenida de Lisboa. José Maria Alvares, tem 21 anos, estuda Gestão em Bath, em Inglaterra, e é militante do Chega. Mas, recusou a presença de dirigentes do seu partido - ou de qualquer outro - no desfile porque, diz, "as pessoas estão fartas de políticos". Para a semana, garante, haverá mais protestos.

"Correu tudo muito bem", resume José Maria Alvares ao Expresso. Aos 21 anos, o jovem estudante de Gestão, pode bem acrescentar ao seu curriculum o facto de ter conseguido fazer parar o trânsito na avenida da Liberdade. Em cinco dias, foi ele quem lançou a ideia de uma manifestação "Pela Liberdade", uma forma de protestar contra as novas medidas de restrição decretadas pelo Governo para fazer face à pandemia.

Tudo virtual e a partir de casa. A partir do seu computador e com a ajuda de um amigo designer, José Maria criou uma página de Facebook que, em pouco dias, reuniu mais de três mil seguidores. Das redes sociais para a rua foi um tiro. O desfile deste sábado, durou cerca de meia hora e juntou algumas centenas de pessoas (300, afirma ele) que obrigaram ao corte de trânsito na avenida da Liberdade. "Se fossem poucos, não era preciso, mas já se estão a juntar bastantes", disse um agente de trânsito ao Expresso, enquanto ia distribuindo pelo chão os 'pinos' que cortavam as laterais que atravessam a maior rua de Lisboa.

As centenas de manifestantes presentes e que gritaram palavras de ordem durante todo o percurso até ao Rossio correspondiam "às expectativas" da organização, mas José Maria é ambicioso e, confessa, "esperava e gostava que estivessem muito mais pessoas". Isto, porque acha mesmo um "ultraje" a forma como os portugueses estão a ser tratados por este Governo e não esconde estar "profundamente indignado" com o que tem assistido.

"Restauração? Tenho um primo que tem um hotel"

À chegada ao ponto de encontro e à hora marcada, já havia manifestantes e faixas prontas a avançar em protesto. A chuva começa miudinha, mas trava a tempo de poupar tudo e todos a uma grande molha. Há ainda uma confusão no ar sobre o objetivo do protesto e os jornalistas perguntam qual a relação desta manifestação com a que, mais abaixo no Rossio, reúne responsáveis da restauração, hotelaria, turismo e cultura. José Maria chega e vai direto ao assunto. "Não tenho nada a ver com a Restauração. Tenho um primo que tem um hotel, mais nada", diz ao Expresso. "Estou aqui porque estou chocado com o que se está a passar".

Já passam 20 minutos da hora prevista e o timing para a entrada em vigor do recolher obrigatório aproxima-se. O organizador fala com a polícia, agradece o apoio e pega no megafone para mobilizar os manifestantes. "Não sou político e não tenho o dom da palavra. Por isso, tenho de ler um discurso", começa por dizer, para depois falar quase só de memória e de improviso. O discurso é rápido, fala em como está "chocado" pela forma como são impostas as medidas de combate à pandemia e em como está ali para defender "a Constituição e o privilégio de viver em democracia".

Além disso, sublinha o "registo apartidário" da iniciativa e o valor de "pensar de forma independente" que se consubstancia nas pessoas que ali estão vindas de várias proveniências. Alguns dos rostos do grupo Médicos Pela Verdade estão ali, assim como vários militantes que contestam algumas das exigências impostas pelas autoridades de saúde, nomeadamente, o uso obrigatório de máscaras.

A manifestação arranca com palavras de ordem de "Pelos Portugueses, pela Liberdade" e vai percorrendo a avenida, ora ao som de "prisão, prisão, ao fim de semana não", de "privação sim, desemprego não" ou "libertem a cultura, não queremos ditadura". Mas, à chegada à meta, já o tom se torna mais político. Começam as críticas aos media - "abaixo os jornalistas" e surgem os primeiros pedidos de demissão, que arrancam pela ministra da Saúde, logo a seguir vem a diretora geral e, mesmo à entrada do Rossio é a vez de "Governo para a rua" e de "António Costa, demissão, demissão".

Militante do Chega, mas à distância

O objetivo de manter os protestos fora da esfera partidária é uma questão estratégica. "As sociedades estão fartas dos partidos e as pessoas querem bom senso", diz José Maria Alvares. Ele que é militante do Chega, garante que agiu sozinho e que "despiu a camisola" para avançar com esta causa. "Acho que o ponto mais importante foi mesmo ser uma marcha apartidária. Por isso houve esta adesão".

O organizador não esconde, porém, que, de início "era totalmente a favor da presença de políticos" e que até enviou mails aos vários partidos que votaram contra a declaração do estado de emergência - PCP, Bloco de Esquerda, Chega e Iniciativa Liberal - para que pudessem participar no desfile. "Alguns, admitiram estar presentes", disse José Maria Alvares ao Expresso.

No entanto, "para chegarmos a acordo e nos associarmos aos protestos do Rossio, concluirmos ser melhor afastar os partidos da iniciativa". E assim juntaram esforços e número de participantes. Todos sem bandeiras partidárias para desfraldar.

O sucesso dos protestos dá balanço aos organizadores. "Foi um balão de ensaio, esta foi a primeira de muitas manifestações em Lisboa", diz José Maria Alvares. E até já há datas marcadas: "no próximo fim de semana haverá mais", promete. As cenas dos próximos capítulos seguem, entretanto, no mundo virtual.

Tem dúvidas, sugestões ou críticas? Envie-me um e-mail: RLima@expresso.impresa.pt

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