Política

Área devastada pelo fogo na Chapada dos Veadeiros corresponde a 54% do município do Rio

Regeneração de toda a flora atingida levará ao menos 10 anos
Homem apaga fogo na Chapada dos Veadeiros Foto: Jorge William / Agência O Globo
Homem apaga fogo na Chapada dos Veadeiros Foto: Jorge William / Agência O Globo

ALTO PARAÍSO (GO) — No 12 dia de incêndio, as chamas ainda torram a paisagem do Parque Nacional Chapada dos Veadeiros . Área de proteção integral e berço de espécies em extinção, a reserva já teve 65 mil hectares devastados pelo fogo , o equivalente a cerca de 27% de toda a sua extensão, de 240 mil hectares. Apesar da diminuição de focos registrada nesta sexta-feira, um rastro de cerca de 40km de labaredas era visto nos sobrevoos.

O pedaço reduzido a quase pó da Chapada corresponde a 54% do município do Rio de Janeiro. Uma tragédia difícil de ser mensurada e que levará ao menos dez anos para ser apagada. Essa é a previsão média de regeneração da flora atingida, segundo Fernando Tatagiba, chefe do Parque Nacional da Chapada:

— O tempo de cada espécie é diferente, mas sabemos que elas vão se recuperar.

Quanto aos animais mortos, o clima é de pesar entre todos os envolvidos no combate ao incêndio. Sílvia Hennel, moradora de Alto Paraíso, tem os olhos cheios d’água ao contar o que ouviu na casa de uma amiga:

— Tinha uma arara gritando, gritando. Aqueles grunhidos tristes. Às vezes parava, parecia que tinha acabado, mas daí voltava, uma coisa muito cruel, até o último grito.

PF INVESTIGA

A Polícia Federal desenhou um plano de perícia que será realizada nos próximos dias no foco inicial das chamas que atingem o Parque da Chapada dos Veadeiros. Mas a investigação já iniciada pela Polícia Civil de Goiás aponta para um incêndio criminoso. Mesmo que não tenha sido intencional, segundo o delegado José Antonio Machado, o dano provocado é crime na legislação ambiental brasileira.

Ele sobrevoou a área nesta semana e entrevistou testemunhas, em geral pessoas do local ou com conhecimento técnico. Com isso, é categórico em afirmar que não há outra razão que explique o incêndio no local. O fogo, segundo ele, só poderia ter sido iniciado por um raio, o que não é comum no período da seca.

— Praticamente não há possibilidade de ser uma ação natural. Foi mesmo provocado — diz o delegado, que a partir de agora colaborará com a PF nas investigações.

Com 466 nascentes, o Parque Nacional da Chapada abriga animais, dos quais muitos só são encontrados por lá. Onça-pintada, pato-mergulhão, cerro-do-Pantanal e lobo-guará são algumas das espécies. De acordo com imagens de satélite, há áreas de refúgio para os sobreviventes, mas a busca por comida e principalmente a reprodução ainda são incógnitas sobre as consequências do incêndio.

Em meio à vegetação queimada, dois carcarás bebiam numa poça de água originada de uma nascente, próxima ao Jardim de Maytrea, um dos cartões postais da Chapada com suas veredas e ao fundo a Pedra da Baleia, que tem a forma do animal. O cenário registrado em máquinas fotográficas de turistas virou cinza. A madeira das árvores ganhou aparência de carvão.

FOGO CHEGOU AO VALE DA LUA

O incêndio devastou a área, exceto uma faixa verde que os bombeiros e brigadistas conseguiram preservar. Quase todas as árvores retorcidas, tão características do Cerrado, foram destruídas. Na ponta de alguns galhos que resistiram, folhas secas na coloração preta teimam em se pendurar.

O fogo não se restringe, porém, ao Parque Nacional da Chapada dos Veadeiros. Um outro foco de incêndio se alastrou e atingiu nesta semana um dos mais conhecidos atrativos da região: o Vale da Lua. As formações rochosas que lembram a Lua adquiriram uma cor mais escura, por conta do fogo, e a vegetação ao redor se transformou em cinza.

Na Pousada Aldeia da Lua, na mesma área, um incêndio chegou a destruir parcialmente um dos chalés do lugar. Era de madrugada quando os funcionários detectaram o que tinha ocorrido. Em plena sexta-feira, não havia um hóspede sequer no local. Os turistas estão fugindo da Chapada.