Enfermeiros: cinco mil cirurgias canceladas desde o início da greve

Paralisação dos enfermeiros nos blocos operatórios levou ao cancelamento de quase cinco mil cirurgias. Médicos criticam "passividade" do Ministério da Saúde. Gabinete de Marta Temido diz que ministério dará "seguimento às cirurgias canceladas".

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Paralisação poderá estender-se a outros blocos, se Governo não iniciar diálogo LUSA/Estela Silva

Por causa da greve dos enfermeiros que se arrasta há duas semanas, foram canceladas quase 5000 cirurgias, das quais 456 no Hospital de Santa Maria, em Lisboa, e perto de 1000 no Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra (CHUC). No Santa Maria, nenhuma criança foi operada desde o início da greve, segundo precisou à TSF o presidente do Conselho de Administração daquele hospital, Carlos Martins.

"É dramático", acrescentou Carlos Martins, prevendo que até ao final do mês, data prevista para o fim da paralisação, 1500 pessoas fiquem por operar. O responsável deixou por isso um apelo ao fim da paralisação. "Esta greve tem de parar, tem que haver uma mesa negocial, sobretudo porque está a afectar a equidade do serviço público. Esta greve já devia ter parado ao fim de 24 horas", declarou.

Depois de na manhã desta sexta-feira o presidente da Secção Regional do Centro da Ordem dos Médicos, Carlos Cortes, ter considerado que o silêncio do Ministério da Saúde em relação a esta greve inédita é "completamente incompreensível", o gabinete da ministra respondeu que o ministério "está preocupado", mas adiantou apenas que "estão a decorrer em permanência reuniões de coordenação" com os cinco hospitais afectados.  Continuando "atento e empenhado na resposta às situações urgentes", o Ministério da Saúde "dará seguimento às cirurgias canceladas", acrescentou.

Só no Santa Maria — o hospital que atende mais doentes do país — a greve deverá ter um custo "de dois a três milhões de euros", segundo Carlos Martins. "Se estiver em causa uma vida ou a qualidade de vida de um doente, a nossa opção é operar. E se tivermos que dirimir alguma situação que seja em tribunal", avisou, dizendo-se disposto a operar "com a discordância dos piquetes de greve", se tal se revelar necessário. 

Já nos CHUC, a secção regional do Centro da Ordem dos Médicos (SRCOM) revelou esta sexta-feira que a greve dos enfermeiros dos blocos operatórios já motivou o adiamento de quase mil cirurgias programadas. À agência Lusa, o presidente daquela estrutura, Carlos Cortes, disse que, "no mesmo período do ano passado, operaram-se 1200 doentes e este ano só 376".

"Apatia" e "irresponsabilidade"

O dirigente contabilizou assim uma produção "de menos 823 cirurgias programadas, sendo 250 convencionais e 573 de ambulatório". 

"Nunca vi nestes últimos anos uma irresponsabilidade, uma apatia e passividade tão grande do Ministério da Saúde perante este problema. E o problema é para os doentes, que não estão a ser operados", frisou.

Segundo Carlos Cortes, há doentes com problemas oncológicos e que necessitam de cirurgias urgentes. Deu também como exemplo o serviço de ortopedia, em que os doentes "correm risco de fracturas se não forem rapidamente operados".

"Há doentes com neoplasias que não estão a ser operados, há atrasos que, porventura, poderiam ser cirurgias não consideradas urgentes, mas que passado algum tempo se tornam urgentes", salientou.

Salientando que há consequências que "podem ser marcantes para os doentes o resto da sua vida", Carlos Cortes considera incompreensível a actuação da tutela perante uma greve que tem cerca de duas semanas e meia. "Estamos perante uma greve com reivindicações e compete ao Ministério da Saúde resolver muito rapidamente toda esta situação. Trata-se de uma situação que considero catastrófica, inédita. No país, nunca conhecemos uma situação desta gravidade."

E porque "provavelmente, na próxima década, o SNS não terá capacidade para resolver" este aumento das listas de espera, Carlos Cortes considera que o silêncio do ministério é "completamente incompreensível".

Os enfermeiros de cinco blocos operatórios de hospitais públicos iniciaram no dia 22 de Novembro uma greve de mais de um mês às cirurgias programadas. A paralisação está a afectar os blocos do Centro Hospitalar Universitário de São João, no Porto, do Centro Hospitalar Universitário do Porto, do Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra, do Centro Hospitalar Universitário de Lisboa Norte e do Centro Hospitalar de Setúbal.

Garantindo que todas as cirurgias urgentes e inadiáveis estão a ser realizadas, os sindicatos admitem estender a greve a outras unidades hospitalares, caso o Governo continue a recusar o diálogo. Em causa estão reivindicações relacionadas com o descongelamento das progressões e a valorização do trabalho diferenciado de uma classe que se declara "exausta" e com milhares de horas de trabalho em dívida. 

com Alexandra Campos

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